"Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave
de rapina. Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita."
O poema acima de autoria de Carlos Drummond de Andrade fala do amor, do "amor sem conta", amor incondicional, sem razão ou explicação, amor que é desejo, sentimento, que não se esgota, amor por ausência, por insuficiência, que nunca é o bastante.
Resolvi escrever sobre o amor ao ouvir a frase "amar é decisão, e não sentimento".Não sei se concordo com ela.
Para mim, dedicação e entrega (a frase continua "é dedicação e entrega") são consequências do amor, e não o amar em si. Não acredito que, numa cultura social em que as pessoas não escolhem seus próprios parceiros, possa a decisão de cada um deles de se amarem reciprocamente ser suficiente ao nascimento do amor.
Também não acredito no amor à primeira vista. Aquela sensação de "borboletas no estômago", de se quererem bem e de se sentirem bem, a que muitos chamam de amor, talvez seja paixão, talvez um nome ainda não dicionarizado, mas amor não pode ser.
Porque amor é muito mais que isso e demanda muito tempo para despontar.
Amor é quando dois tornam-se um e, de tão imbricados que vivem, já não é mais possível distinguir o que é genuinamente de um ou um mero eco do outro.
Amor é quando a vida do amado passa a ser tão ou mais importante que a do próprio amante, para quem a perda do amado é uma perda de si mesmo.
Como escreveu Lygia Fagundes Telles:
"Estranho, sim. As pessoas ficam desconfiadas, ambíguas diante dos apaixonados. Aproximam-se deles, dizem coisas amáveis, mas guardam certa distância, não invadem o casulo imantado que envolve os amantes e que pode explodir como um terreno minado, muita cautela ao pisar nesse terreno. Com sua disciplina indisciplinada, os amantes são seres diferentes e o ser diferente é excluído porque vira desafio, ameaça.
Se o amor na sua doação absoluta os faz mais frágeis, ao mesmo tempo os protege como uma armadura. Os apaixonados voltaram ao Jardim do Paraíso, provaram da Árvore do Conhecimento e agora sabem."
Amor é quando a vida do amado passa a ser tão ou mais importante que a do próprio amante, para quem a perda do amado é uma perda de si mesmo.
Como escreveu Lygia Fagundes Telles:
"Estranho, sim. As pessoas ficam desconfiadas, ambíguas diante dos apaixonados. Aproximam-se deles, dizem coisas amáveis, mas guardam certa distância, não invadem o casulo imantado que envolve os amantes e que pode explodir como um terreno minado, muita cautela ao pisar nesse terreno. Com sua disciplina indisciplinada, os amantes são seres diferentes e o ser diferente é excluído porque vira desafio, ameaça.
Se o amor na sua doação absoluta os faz mais frágeis, ao mesmo tempo os protege como uma armadura. Os apaixonados voltaram ao Jardim do Paraíso, provaram da Árvore do Conhecimento e agora sabem."